domingo, 26 de fevereiro de 2012

Andarilho

Aprendi num filme uma vez que daquilo que estamos tentando dizer alguém já disse de algum jeito muito mais rebuscado e interessante do que nós. Pois bem, Hermman Hesse escreveu em "Caminhada":

"Sob muitos aspectos o andarilho é um ser primitivo... mas é o desdém pelas fronteiras e pela vida sedentária que torna seres como eu [andarilho] os guias do futuro."

Quando eu era criança, sempre ouvia na igreja que nós, os cristãos salvos-convertidos, não eramos "cidadãos deste mundo". Depois que cresci, decidi rejeitar essa expressão, pois passei a crer que é no mundo, e não fora dele, que minha Fé deve ser professada. Comecei a admitir: sou um ser mundano. Porém, após calçar as sandálias e sair do conforto das mesas e da cama, percebi que minha índole não era tão mundana quanto eu achava, não sou tão cidadão do mundo quanto pensei...

As sandálias que uso me deram um gosto por andar, uma paixão por não deixar meus pés fincados sempre no mesmo chão. Estou utilizando de metáforas, claro, e, deixando de utilizá-las somente nas palavras, comecei a encarná-las e, metaforicamente, me fiz um "andarilho". Descobri que não sou torcedor de um único time, não frequento a mesma igreja, não me sinto em casa somente em uma casa, não faço parte de uma mesma membresia, não sou cego seguidor de um ou de outro grupo. Não há espaço nesse mundaréu de lugares que seja suficiente para suportar minhas pernas. Ou talvez minhas pernas não sejam tão fortes para aguentar ficar de pé ou sentadas no mesmo espaço. No fim, deste mundo não pertenço...

 Deixei meus passos excederem o mundo, passarem dele, e não se conformarem com seu tamanho. Não posso deixar que um único mundo me sustente, não posso esgotar os seus recursos, não posso fazer de seus habitantes meus escravos, não posso me deixar ser servo-senhor dos pobres-reis. Quero que o mundo seja inútil para que possa amá-lo sem exigir nada em troca. Quero ser insuficiente e fraco para um grupo e, que desse modo, ele ande com as próprias sandálias e as próprias pernas, independentemente de qualquer imperador ou qualquer andarilho que o lidere. Mais do que líder ou senhor eu quero ser guia. Meus pés pedem um andarilho. Assim como Hesse, quero desdenhar fronteiras...

Vivo para esquecer dos ideais que separam os homens, das crenças que os matam, das aparências que os limitam e do mundo que cada um crê ser seu. Sou de outra terra, sou de outro mundo, sou um andarilho que é filho do lugar onde estiver e livre das máscaras e das correntes inventadas pelos cidadãos mundanos.

Não sou cidadão do mundo; sou andarilho, mas não indigente. Tenho nome, tenho vida, tenho sonhos. Nesse rumo, não há mundo que sustente tamanho amor pela inutilidade, tamanha paixão pelo amor...


Gratis i Kristus